"Todos dizem ser forte o rio que tudo arrasta. Ninguém diz serem fortes, as margens que o comprimem"

domingo, 10 de maio de 2009

Entrevista


“ Gostava de ter sido arquitecto", Diogo Morgado

Com apenas 26 anos de idade Diogo Morgado é já um dos melhores actores portugueses, tem um curriculum invejável. Neste momento interpreta extraordinariamente o papel do justiceiro Santiago, até agora o papel da sua vida. Humano, humilde, divertido e sem vedetismos, Diogo Morgado deu uma entrevista exclusiva ao Rosa10, onde mostrou o homem despido de qualquer personagem.

Rosa 10: Como surgiu a ideia de ser actor?
Diogo Morgado: Foi por acidente, ou seja eu não tinha ideia de nada, eu via as novelas na televisão e nem sequer me atrevia a pensar em ser actor, era uma coisa tão inalcançável, tão inatingível que eu nem sequer sonhava com isso, achava que era perfeitamente patético da minha parte pensar que podia vir a gostar de ser actor.
Quando eu tinha 14 anos surgiu um casting, na revista super jovem, para manequins eu e um grupo de amigas minhas do liceu tirámos fotos. Acabaram por me chamar, tirei um curso de manequim. E comecei a trabalhar na Elite. Um ano depois chamaram-me para o primeiro casting para a telenovela “ Terra Mãe” acabei por ficar. Estreei-me logo ao lado do Armando Cortez e da Lídia Franco, o meu director de actores era o Virgílio Castelo e as coisas começaram assim.


E o “Amo-te Teresa”? Foi onde ficou mais conhecido?
O “Amo-te Teresa” veio uns aninhos mais tarde. A diferença foi que antes as pessoas costumavam dizer, olha o “ Miguel da novela,” depois fiquei conhecido por Diogo Morgado, ou seja as pessoas começaram a associar um projecto ao nome de uma pessoa. Essa foi a grande diferença. As pessoas começaram a dizer “olha um puto qualquer que faz o Amo-te Teresa e chama-se Diogo”

Quantos anos tinha quando entrou no “Amo-te Teresa”. Como foi para o Diogo com essa idade fazer esse filme?
Tinha 18 anos, e quando fizemos o filme não tínhamos a percepção do que estávamos a fazer. Aquilo era uma história filmada para passar na televisão, na SIC. Eu nem sequer percebia a importância de estar a ser gravado em película.

Mas não tinha a noção da grandiosidade que o filme ia ter?
Não, acho que nem a própria SIC tinha, mas resolveu investir. Foi um projecto que englobava uma parceria com várias entidades e a SIC não quis de forma alguma que isso caísse em saco roto e apostou bastante em publicidade na altura do “Amo-te Teresa”. Acho que o sucesso do filme foi por causa da publicidade. O filme era bom e acho que ficou na memória das pessoas. Quem viu o filme gostou, poucas pessoas disseram mal do filme e quem o disse foram os críticos de cinema armados aos cucos… é impossível agradar a toda a gente, mas a maioria do público gostou.

Estudou teatro, andou no conservatório?
Não, não andei no conservatório. Na altura quando acabei o 12.º ano tive grandes dúvidas quanto ao que havia de fazer; se devia tirar um curso que não tivesse nada a ver com representação ou tirar o conservatório. Decidi por mim mesmo que iria esperar um tempo até me decidir, e acabei por não tirar o conservatório. Neste momento estou a tirar um curso de Estudos Artísticos na Faculdade de Letras, mas está muito complicado, nunca mais consigo acabar, agora com o tratado de Bolonha faltam-me dois anos. Mas fiz cursos de teatro, tirei em Madrid dois workshops intensivos, um de dois meses e outro de seis, de teatro de máscara comédia e outro mais forte, dramático. E a minha formação acaba por ser, do ponto de vista do curso da faculdade mais teórico no que se refere às peças e ao trabalho dos autores e no ponto de vista prático no que se refere ao trabalho que tenho vindo a fazer e aos dois cursos que tirei em Madrid.

O que é que gostava de ser se não fosses actor, já pensou nisso?
Não sei, já pensei, já. Ao contrário do que se possa pensar eu dou-me muito bem com o trabalho individual e até de escritório, eu sei que ninguém estaria á espera que eu disse-se uma coisa destas, mas eu adorava ter sido arquitecto. E durante muito tempo ponderei se não deveria entrar num curso de arquitectura.

Via-se mesmo a ser arquitecto, tem jeito para desenhar?
O pior é que tinha… (risos). Vários professores que me diziam que eu tinha que ser, e houve um que disse mesmo que eu só podia ser arquitecto.

E desenha, pinta?
Deixei de desenhar, desenhava bastante e razoavelmente bem, não posso dizer bem porque seria pretensioso. A nível de publicidade de designtambém, este ano tive a cadeira na faculdade e correu bastante bem.

Tem um bar, de onde é que surgiu essa ideia de ter um bar?
Principalmente do meu irmão, eu já tinha tido um bar em Santos, que era o II Acto. Sei o trabalho que dá e é uma coisa que te transforma a vida, que é uma coisa que o trabalho não deve fazer. Eu acho que o trabalho deve te influenciar a vida ao mínimo,deve ser uma coisa paralela.

Eu sei que se entregou muito ao II Acto, é verdade?
É, porque não há outra forma das coisas resultarem, se tu queres ver frutos das coisas tens que te entregar.

O Bar fechou,o que correu mal no II Acto?
Falta de tempo, e o facto de eu não querer fazer da minha vida, uma vida sem sol, era trabalho só á noite e eu não sou muito amante da noite.

Não gosta de sair á noite?
Não é não gosto, não sou fã, é um programa que entra para aí em sexto lugar na minha lista de prioridades para me divertir.

Então o que é que faz para se divertir?
Principalmente, grandes almoços com os meus amigos, adoro. Adoro praia no verão. Adoro ficar em casa no Inverno a ver filmes. Estar em casa dos meus pais. Há muito antes de sair á noite. Há toda uma vida.

E o filme rodado no Brasil o “Amazónia”?
Foi giro. Agora está a passar uma novela que é a “Amazónia” e é muito giro porque eles a nível plástico usam as mesmas coisas que nós tínhamos, os seringueiros, as árvores-da-borracha, os homens que trilham os caminhos, a cidade cinematográfica, tudo.
Vou-te ser sincero, para mim não foi um trabalho, que eu dissesse, este foi o trabalho da minha vida, não foi.

Mas contracenou com grandes actores brasileiros?
Sim, mas essencialmente o que eu tirei daquele projecto foi o ter conhecido a Amazónia.Porque aquilo mexe com a tua escala de valores e com a maneira de veres as coisas. Tu vês miúdos que andam descalços, não usam roupa mas que não tem fome,e isto dá-te uma escala de valores importantíssima.Sem cair na desgraça alheia, ou seja sem ir para Africa, ver crianças doentes a morrer á fome,sem teres que sofrer por isso, sem teres que levar com esse choque humano;vais por um lado positivo que te eleva, que não te faz sentir bem á custa dos outros mas faz-te compreender a escala das coisas.Vês um miúdo sem roupa nenhuma mas ele está bem, está saudável e está sem fome. No fundo o que ele precisa é de comer mais nada.

Foi então uma experiência mais importante a nível pessoal que profissional?
Para mim, sim.

Esteve quanto tempo na Amazónia, e como é que foi?
Quatro meses. É uma questão de adaptação a primeira semana custou um bocadinho, a humidade é muita, por exemplo deixas um t-shirt no quarto de hotel e se te esqueces de ligar o ar condicionado quando chegas tens a t-shirt molhada, porque a humidade sente-se mesmo, é uma coisa que quase se pode agarrar. Mas ao final de uma semana já nem notas, parece que desapareceu, o corpo habitua-se. Acontece a mesma coisa com a alimentação e com os mosquitos, o teu corpo começa a ganhar imunidades e os mosquitos já não atacam tanto, apesar de ter apanhado a dengue.

Como é que tratou a dengue?
Fui gravar com 40º de febre, levei duas injecções de penicilina nas nádegas que foi algo que jamais pensei que custasse tanto, não dá para sentar é horrível (risos). Veio uma médica numa canoa, estávamos nós a gravar lá nos confins da terra e eu já não conseguia dar duas para a caixa, uma hora depois de levar as injecções já não era nada comigo até fazia o pino. (risos)

Foi então uma boa experiência na Amazónia, é para repetir?
Ui (risos). Mas é para repetir, a dengue foi uma coisa que acontece, tu estás lá muito tempo podes apanhar no primeiro como podes nunca apanhar. Apanhei a dengue porque nós fomos filmar para uma zona densa e quanto mais densa a vegetação mais mosquitos, mais bichos, mais cobras, nós vimos cobras corais. Eu apanhei uma tarântula com cerca de meio quilo, castanha não negra portanto não é venenosa, e aquilo é um pitéu, um grande pitéu, uma colherzinha tipo sapateira (risos).


Vamos falar um bocadinho da “Vingança”. Está a trabalhar com a Lúcia Moniz, que já me disse ser um grande privilégio, como está a ser esta experiência?
Maravilhoso, trabalhar com a Lúcia, com o Paulo, com o Nico, com a Cucha e com o Luís Brás. São pilares importantíssimos, não só para que a novela corra bem, mas para eu me consiga aguentar, porque eles não deixam que as coisas corram mal.
A Lúcia Moniz já passou por Hollywood, e o Diogo? Hollywood não?
Não… não,eu vou-te ser sincero, coisas como o ter estado na Amazónia, fazem-me ver que uma pessoa pode ser muito, muito feliz com muito pouco. E nós quanto mais longe metemos a meta, mais tempo perdemos a ser infelizes. Eu preferia daqui a uns anos sentir-me orgulhoso por ter contribuído em poucos projectos em Portugal mas que fizessem os portugueses orgulhosos e dissessem que nós já fizemos coisas muito boas e por sorte eu estava lá, eu fico feliz com isso. Não estou á espera de encontrar o reconhecimento lá fora, se duas ou três pessoas me reconhecerem numa população de mil eu já fico satisfeito, portanto eu não preciso de massas, de um milhão de americanos a dizer que este actor até é bom para um filme, portanto não preciso disso. Há uns tempos atrás achei que era uma coisa engraçada, achei piada. Entretanto a Globo convidou-me para ir para lá,estive lá três meses á espera não se sabe do quê, de um projecto que saiu furado e entretanto vim-me embora porque não dava. Da Globo, pensasse que é muita coisa, mas não é tanto como isso, e em muitos aspectos nós estamos muito á frente da Globo. Vim-me embora porque acho mais importante fazer cá coisas bem feitas.

E se surgisse um convite?
Se surgisse um convite claro que sim, eu não sou estúpido ao ponto de dizer que não, claro que sim. Mas não é algo que eu corra atrás nem ande sempre a pensar nisso.

Qual foi o papel da sua vida?
Não sei…não sei, talvez um papel que eu não estivesse á espera. E este, -personagem Santiago, telenovela Vingança -, não estava á espera. Conscientemente não era capaz de dizer era isto que gostava de fazer, mas interiormente poderia dizer este é capaz de ser o papel da minha vida.

Então este é o papel da sua vida?
Neste momento é. Porque é o que mais dificuldade me estar a dar, até pela sua duração, não é um filme, não é uma série, vamos agora para o décimo primeiro mês de novela, em que estamos a gravar doze horas todos os dias da semana, e alguns sábados também.

Como se prepara para o Santiago?
A nível prático, preparo a semana ao fim-de-semana, ao sábado descanso e ao domingo estou a preparar a semana toda. Tento gerir os dias mais complicados, aqueles onde eu posso relaxar mais, para não me desgastar muito, para que nos dias mais fortes eu esteja focado e preparado para eles. Agora a nível emocional é complicado… é complicado… ás vezes consigo afastar-me e dizer isto está a correr desta forma porque eu quero e porque pensei ser assim, noutras alturas não. Há dias em que não consigo fazer aquilo que me propus, não quer dizer que seja mau, que seja bom, mas não é aquilo que eu pensei fazer.

Existem semelhanças entre o Santiago e o Diogo Morgado?
Muito poucas, semelhanças a nível de personalidade, não, mas há algumas características físicas, algumas atitudes.

Como por exemplo?
Talvez o rápido sentido de injustiça e a vontade de querer resolver logo as coisas, essa impulsividade estúpida e ingénua do Santiago talvez seja um bocadinho parecida comigo. Se eu sinto que está alguma coisa mal, tenho que a resolver na hora e digo na cara das pessoas, não quero saber o que as pessoas possam pensar com este tipo de atitude, eu vou direito às pessoas.

Qual é o seu escape para se libertar das personagens e voltar a ser o Diogo?
É muito fácil voltar a ser eu estando com a minha família, eu estando com eles rapidamente volto a ser eu. É uma grande terapia, um grande catalizador. São o meu porto seguro. Principalmente o meu irmão que está com 20 anos, tem a vida dele os problemas dele, mas quando estamos juntos, estamos juntos, como há 20 anos atrás.


Falou da sua família, trocaria a sua carreira de actor pela sua família?
Se ela precisassede mim, sem dúvida, se a minha família precisasse de mim para alguma coisa que me impedisse de ser actor claro que sim.

Onde entra o amor na sua vida?
Entra no espaço disponível.

Que é muito pouco?
Que é o suficiente para agora.

Que projectos tem a seguir à novela?
Tenho teatro para fazer já agendado

E qual é a peça?
Eu vou fazer o meu primeiro monólogo, vai estrear no dia 12 de Janeiro no teatro politécnico, numa co-produção do Malaposta com o Teatro Nacional, depois também irei em Março alguns meses para o Malaposta. Portanto o ano que vem, pelo menos metade do ano vai ser ocupado com isso.

E a peça já tem nome?
Já, “Nickname”.

E fala sobre o quê, quem interpreta?
É a história de um louco pirata cibernético, eu sou o louco pirata cibernético

Quem é que escreveu a peça?
O Mário Máximo, um autor português e vai ser encenada pelo Manuel Coelho.

E consegue-se ver num papel de um louco pirata cibernético?
Eu ainda não vejo mas o Manuel Coelho, diz que sim, portanto eu confio plenamente nele

E como se sente por ir fazer o primeiro monólogo?
Com muito medo, mas até começar a ensaiar não tenho muito a noção de como vai ser. Também não gosto de sofrer por antecipação.

E férias, agora em Agosto para onde?
Não sei, ainda não sei

E qual era um sitio de sonho para passar férias?
Ontem o Sérgio dos Anjos falava-me na Costa Rica, e ele falou tão bem, tão bem que eu comecei a projectar-me na Costa Rica.

E antes da viagem á Costa Rica há outros sítios que gostasse de ir?
As minhas viagens de sonho, eu já as fiz, o maior sonho era Machu Picchu no Peru, foi uma viagem maravilhosa, um sítio maravilhoso para se conhecer. Já estive na Grécia, foi um bocado uma desilusão, mas também já me disseram que não conheci o melhor da Grécia e estive também em Nova Iorque.
















Perguntas Rosa

Qual foi a sua melhor recordação de infância?
A melhor recordação de infância… o nascimento do meu irmão.

Qual é a sua essência?
Terra

Qual foi o melhor elogio que lhe fizeram?
Que eu sou persistente

Tem algum ídolo ou algum modelo?
Não…tenho várias pessoas que têm características que eu gosto, que procuro identificar-me com elas e procuro alcança-las, não há assim uma pessoa que reúna tudo aquilo que eu goste

Que imagem tem do homem e da mulher portuguesa?
Hospitaleiros, honestos, simpáticos…

E se não fosse tão conhecido que excentricidade cometeria?
Tatuagens, adoro tatuagens

E qual foi até hoje a sua maior oportunidade?
Eu acho que foi a primeira, quando fiz o casting da “Terra Mãe”

O que é que o faz rir?
Subtileza.

Qual foi a maior lição de vida que recebeu até hoje?
Nós recebemos várias e infelizmente estão ligadas com a desgraça alheia, eu tenho dois casos na minha vida de coisas que podiam ter corrido melhor e isso para mim são grandes lições. Para mim, sempre que eu penso que tenho alguma questão menos boa, se calhar ela é só uma fase é uma característica que não é assim tão má quanto isso e são grandes lições de vida. Tive em sítios com crianças ao colo com cancro e mais tarde voltei lá as mães mostraram-me as fotografias e as crianças já não existiam e isso dói muito.

E como vê o seu futuro?
Com família, com a minha família espero eu, família que eu vou criar, com a que já tenho e toda a gente reunida á mesa a comer umas sardinhas assadas

Se fosse jornalista do Rosa10 quem gostaria de entrevistar e porque?
Talvez o professor José Hermano Saraiva, porque me faz confusão, como será a vida dele, como é o seu dia-a-dia , quem são os seus amigos, quem é a mulher. Porque eu quero saber até que ponto uma pessoa pode viver um dia-a-dia normal, com as histórias e com a cultura que ele tem na cabeça, uma cultura enfatizada ao máximo, aquilo é tudo uma hipérbole da realidade e dos factos históricos que é mais grave ainda. Portanto fazer uma entrevista mais descontraída ao professor José Hermano Saraiva, essas doze perguntas que me estás a fazer gostava de fazer a ele.


Qual é a pergunta que nunca lhe fizeram, e que gostava de responder?
Não sei… para já responder a perguntas, gosto de conversar, há várias conversas que eu gostava de ter com as pessoas, e as conversas não são identificáveis.

Sem comentários:

Enviar um comentário

LinkWithin

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...